(Publicado na edição de 14 de Agosto de 2003 do jornal BARLAVENTO)
Hoje, estamos todos de luto. Os incêndios florestais que carbonizaram mais de trezentos mil hectares de Portugal e causaram mais de mil milhões de euros de prejuízos representam o capítulo final do mundo rural e afectam seriamente uma das mais importantes vantagens competitivas da nossa economia.
Hoje, estamos todos de luto. Os criminosos que atearam as chamas e aqueles que não tiveram engenho para prevenir tamanha catástrofe contribuíram em partes iguais para a morte de milhões de árvores que produzem o oxigénio que respiramos e alimentam o interior desertificado de Portugal.
Hoje, estamos todos de luto. Independentemente da cor política, da religião, do desprendimento com que enfrentamos as tragédias alheias ou simplesmente por estarmos de férias, estamos todos de luto e devemos reflectir sobre a tristeza que nos avassala...
Todos, sem quaisquer excepções. Apesar de tudo, Portugal não merecia tanta incúria, tanta falta de civismo, tanto amadorismo e tanta incapacidade de antecipação. Este tempo de luto também serve para chamar a atenção para o que está mal, questionar soluções e apontar caminhos para o futuro!
E há dois rumos possíveis, analisar a situação em matéria de prevenção e combate aos fogos, por um lado, e na perspectiva da gestão e do ordenamento agro-florestal e da valorização do mundo rural, por outro. E, por si só, qualquer uma delas ocuparia mais espaço do que aquele que temos disponível.
No primeiro caso, tudo passa pela prevenção integrada capaz de reduzir o número de ocorrências, pela capacidade de detecção e pela intervenção eficaz no início das ocorrências e por uma coordenação de meios humanos e logísticos capaz de lidar com eficácia nas situações mais graves.
Contudo, estes pilares foram abalados por medidas políticas precipitadas, mal calculadas e de carácter economicista da coligação PSD/PP - a extinção da CNEFF (Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais), a suspensão do alargamento da rede de Grupos de Intervenção Permanente, a interrupção do processo gradual de fusão das estruturas de coordenação e socorro e o cancelamento do programa plurianual de reequipamento dos corpos de bombeiros.
Por outro lado, culpam-se os proprietários e as condições meteorológicas e aponta-se a falta de limpeza das matas, de pontos de água e de acessos. A cooperação entre os produtores, das autarquias e dos organismos estatais é fundamental para conjugar esforços e canalizar recursos financeiros. O associativismo é a melhor arma face à desertificação e ao envelhecimento das populações, é a melhor solução para prevenir os danos, valorizar o potencial económico e recuperar os prejuízos sofridos.
Portugal detém os conhecimentos científicos e os recursos necessários para impedir a repetição desta tragédia e garantir a recuperação da floresta, para tal basta inverter o caminho prosseguido até aqui, apostando-se seriamente na prevenção e no desenvolvimento sustentado do Mundo Rural. Porém, dada a dimensão e a complexidade do problema, a criação urgente de um programa de relançamento económico para os concelhos mais atingidos pelos incêndios deverá ser outra prioridade!
Nota final para a coragem e o empenhamento dos bombeiros do Algarve no combate aos fogos e na protecção das pessoas e bens, ao pé da porta ou longe da sua área de intervenção operacional, numa clara demonstração de solidariedade e de sentido cívico ilimitados. Fica registado nestas linhas o nosso apreço e reconhecimento pelo seu espírito de entrega e de bem-fazer!
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