(Publicado na edição de 5 de Agosto de 2004 do jornal POSTAL DO ALGARVE)
Os incêndios das últimas semanas serviram para sublinhar a nossa dificuldade de aprender com os erros do passado recente e para a facilidade com que muita gente sacode a água do capote e volta repetir promessas.
Ainda as polémicas sobre as cartas de risco de incêndio e zonas de vigilância sob a tutela militar não tinham arrefecido, já as chamas crepitavam vorazes nos montes de Santa Maria e da Conceição de Tavira, devastando imensas áreas de baldio semi-abandonado e reduzindo a cinzas anos de esforços despendidos na sua reflorestação por inúmeros proprietários e entidades públicas e no ordenamento cinegético por intermédio de associações de caçadores.
Em poucas horas, apesar dos esforços solidários de largas dezenas de bombeiros e populares, as lacunas dos processos de prevenção e de combate aos fogos florestais tornaram-se tragicamente evidentes, todas a promessas por cumprir emergiram nas nossas memórias.
Para tentar ocultar uma falta de visão estratégica gritante e as ausências continuadas de investimento na modernização do meios de intervenção dos bombeiros municipais, houve que agitasse rapidamente com pedidos de declaração de calamidade pública e acusações aos presumíveis culpados para garantir alguns segundos de fugaz atenção mediática.
Passado um mês, ultrapassada a crise política que derrubou os ministros da Administração Interna, da Agricultura e da Justiça, o pedido continua a ser analisado pelas competentes entidades governamentais e as acusações serão alvo de processo judicial que conhecerá o seu desfecho... oportunamente!!!
Entretanto, as atenções viraram-se para outros concelhos. Monchique, Portimão, Castro Marim, Alcoutim, Loulé e, paradoxalmente o único município com plano de prevenção aprovado, São Brás de Alportel também conheceram horas difíceis.
Infelizmente, apesar das lições dos anos anteriores, não tivemos mais uma vez capacidade para antecipar a dimensão desta catástrofe, mobilizando atempadamente os meios necessários para limitar o incêndio nas suas primeiras horas. Quando já era tarde, mandaram-se para o terreno bombeiros doutras zonas do País, desconhecedores do terreno, e rejeitaram-se precipitadamente meios aéreos que revelaram-se decisivos na sua extinção!
O ecossistema sensível da Serra do Caldeirão foi devastado pelas chamas, colocando em risco o frágil equilíbrio da fauna e da flora e prejudicando economicamente muitas famílias que encontravam na serra os meios de subsistência.
As principais zonas de produção da melhor cortiça do mundo foram afectadas gravemente, o que não deixará de trazer consequências no curto e médio prazo para as unidades de transformação industriais, com os inevitáveis efeitos no tecido sócio-económico do barrocal e da serra algarvias.
Sem oposição determinada às consequências dos fogos florestais, o envelhecimento crescente da população residente consolidará a progressiva desertificação humana.
Para estes problemas, são necessárias soluções que não fiquem na gaveta como muitas das promessas efectuadas após os incêndios de 2003, soluções que não emperrem por falta de vontade política ou para cumprir qualquer limite orçamental, soluções que sejam concretizáveis e sustentáveis no tempo, soluções que permitam a sedentarização das famílias mais jovens e perspectivem-lhes um futuro mais tranquilo.
Compete aos detentores do poder, a nível nacional e local, não trair a confiança das pessoas. E, notem bem, as expectativas são cada vez mais reduzidas!
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