quinta-feira, maio 20, 2004

Escrevo sempre como se tivesse algo para dizer...

"Escrevo sempre como se tivesse algo para dizer
e se o dissesse fosse a maravilha viva
que abolisse a permanente pressão do destino
Seria a coincidência Mas coincidência com quê?
Com algo que não sei que quer fluir que quer ser
e tem a violência do que antecede a significação
Poderá o poema como uma cópula culminar no abandono
de uma extrema doçura de uma tranquilidade de linfa
Como foi o início deste suave assombro? Foi talvez a doce surpresa de um adolescente
em que o sémen despontou levemente como o orvalho de uma flor
Ou foi o beijo que Narciso deu na sua imagem no espelho
e sentiu que era outro como um corpo a acender-se em suave efervescência
Sim o início é a sensação nua e ardente
o fogo a revelar a sua impetuosa energia
e na sua violência a doçura cálida de uma lua
e no silêncio a surpresa que gera o amanhecer do poema"

António Ramos Rosa, in Deambulações Oblíquas

Sem comentários: