(Publicado na edição de 7 de agosto de 2014 do Jornal do Algarve)
Passado quase um ano
após as últimas eleições autárquicas e aproximando-se o final da legislatura, é
tempo de voltar a abordar a temática da regionalização administrativa do
território continental numa perspetiva pré-eleitoral pragmática…
Carta Corográfica do Reino do Algarve (1842) |
Nos termos constitucionais vigentes, a
organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais,
consideradas pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos,
que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas. No
continente, as autarquias locais são as freguesias, os municípios e as regiões
administrativas.
Durante estes quarenta anos de
Democracia, com mais ou menos percalços, os municípios consolidaram a presença
histórica dos concelhos com novas atribuições e competências e a recente
reorganização das freguesias concretizada contra a vontade dos autarcas ainda
não mereceu a simpatia das populações.
Com lei própria definindo osrespetivos poderes, composição, competência e funcionamento dos seus órgãosaprovada desde 1991, as regiões administrativas encalharam nos preceitos
constitucionais que preveem a sua criação simultânea e a necessidade de uma
duplo referendo, a nível regional e nacional. Um verdadeiro travão que o atual primeiro-ministro prometeu eliminar nesta legislatura…
A dupla recusa no referendo de 1998
provocou um necessário adiamento da implementação da regionalização, levando os
sucessivos governos a procurarem formas alternativas para aprofundar a
desejável descentralização administrativa prevista na Constituição, assentes
essencialmente em formas mais avançadas de associativismo municipal, com
enquadramentos legislativos instáveis, sempre dependentes das boas vontades
governamentais e com níveis de sucesso diferenciados.
No máximo, verificou-se uma delegação
de competências na gestão dos fundos comunitários regionalizados, que permitiu
uma estruturação mais sólida das associações de municípios, capacitando-as para
gerir de forma mais eficaz e eficiente os recursos financeiros
disponibilizados. Porém, tal foi sol de pouca dura e a regra foi a sua gestão
por organismos desconcentrados da Administração Central, sem legitimidade
política direta e com capacidade operacional limitada pelos ditames centralistas.
Na minha opinião, este é o momento de
refletir sobre os erros recentes, avaliar o processo de multiplicação de áreas
metropolitanas e comunidades intermunicipais e respeitar a Constituição,
avançando para a instituição em concreto das regiões administrativas. Estou
convencido que, aproveitando a onda de racionalização administrativa e o
sentimento generalizado de contenção da carga fiscal e da despesa pública, esta
poderia ser a reforma da próxima legislatura!
Mesmo que não haja unanimidade nacional
sobre o desenho da divisão do território em cinco regiões, parece-me haver
consenso sobre a eliminação dos travões constitucionais, permitindo que a
sintonia territorial da maioria das circunscrições setoriais da administração
desconcentrada do Estado potencie a criação da região-piloto do Algarve,
consolidando os resultados obtidos com o PRACE, durante os últimos governos do
PS, ou com o PREMAC, desenvolvido pelo governo PSD/CDS!
Aliada a uma reforma do sistema
eleitoral, a atribuição de relevância política às Comissões de Coordenação e
Desenvolvimento Regional a tempo de permitir a eleição dos órgãos representativos
da região em 2017, em simultâneo com a eleição dos órgãos das autarquias locais,
assume-se como uma solução faseada capaz de proporcionar uma experiência de
regionalização com a qual todos possam aprender.
Sinteticamente, refira-se que os
órgãos previstos da região são a assembleia regional e uma junta com apenas
cinco membros com funções executivas, podendo substituir uma multiplicidade de anónimos
dirigentes de órgãos mais ou menos conhecidos da administração desconcentrada
sem qualquer legitimidade política decorrente do sufrágio direto e universal.
Por sua vez, a assembleia é o órgão
deliberativo e é constituída por membros eleitos diretamente e por membros, em
número inferior ao daqueles, eleitos pelo sistema da representação proporcional
e o método da média mais alta de Hondt, pelo colégio eleitoral formado pelos
membros das assembleias municipais da mesma área designados por eleição direta.
Com a atual reforma do Estadobloqueada no Terreiro do Paço, a criação das regiões Administrativas fomentaria
a sua concretização, com ganhos evidentes para a qualidade de vida das pessoas
e para a melhoria dos níveis de cidadania!